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10 de outubro de 2009

O Ulisses em cada um de nós


Poseidon enfurecido com Ulisses (Odisseus) e sua tripulação na volta para Ítaca

A Odisséia de Homero pode ser considerada um dos tesouros literários da humanidade. A obra, junto com a Ilíada, é considerada o começo da literatura Ocidental. ´
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A Odisséia é a história de Ulisses (em grego, Odisseu), rei de Ítaca, que deixou sua terra, sua amantíssima esposa Penélope e seu filho Telêmaco para ir lutar por dez anos na Guerra de Tróia ao lado de outros reis gregos como Menelau e Agamenon. [...] Merecidamente [após vencer a guerra] quis voltar para casa. Mas, ao sair das terras troianas, ofendeu o deus do Mar, Posseidon, que jurou impedi-lo de voltar a Ítaca. Esse deus se ofende mais quando Ulisses ataca um de seus filhos – o ciclope Polifemo – gabando-se de sua sina de herói invencível.
O retorno de Ulisses dura mais de vinte anos – vinte longos anos de batalhas, amigos mortos, cansaço, aventuras, desistências, derrotas e vitórias. A Odisséia é a história dessa longa viagem.
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A maior metáfora da Odisséia é que cada um pode ser o herói de sua própria história. Ler essa história e acompanhar a sofrida e vitoriosa trajetória de Ulisses nos faz pensar no que como alguém se transforma em um herói ou heroína. Se há pessoas vitoriosas transitando por aí, também há pessoas derrotadas e cansadas; pessoas que perderam algo, que foram aniquiladas em suas chances de vencer, e nem querem mais isso. Não se trata da obsessão maníaca de vencer por vencer, mas sim de se querer algo, nem que seja um gosto bom de tranquilidade. De tantos guerreiros que saíram de Tróia com Ulisses e na volta para casa, apenas ele chegou a Ítaca e alcançou o seu prêmio, porque algo nele havia de diferente, um brilho especial. [...] É importante entender que um herói se faz não em um momento ou uma situação, mas por toda uma vida de aprendizagem e retomadas. Ser herói não é nada fácil.

O caminho do herói é a aventura. [...] O caminho da aventura exige renúncia do calmo, do tranquilo, do descanso. Há que se buscar a mudança, o movimento, aquela emoção que sacode a alma. Aventurar-se é se jogar em direção ao desconhecido, sem saber do futuro. Sempre, um caminho sem volta. Talvez, um caminho difícil. Mas, ainda assim, um caminho de glória. O herói vive em nós, se não está amordaçado e calado, sabe que não adianta esperar e esperar para que a vida aconteça diante de nós. [...] Para ter a vida, é preciso buscá-la, com coragem. Essa disposição, essa força para lutar vem de dentro. E para dentro ela volta a cada batalha vivida, seja ela vencida ou não. O herói dentro de nós precisa ter vez para falar, precisa ser vivo e forte.

Nenhum herói colhe só sorrisos em sua trajetória. Dos mais antigos aos mais modernos, eles passam por um duro processo de amadurecimento, de lapidação, que em boa parte dos casos, se dá pela dificuldade, pela dor. Ulisses viu seus companheiros morrerem um a um. Desceu a Hades (inferno) e teve que olhar a morte. [...] E quando voltou, sozinho, teve que se passar por mendigo para ver sua casa tomada por homens que o traíram e destruíram seu patrimônio. Ele sofreu, e muito, como sofremos todos, os que optam por andar ou por parar. Porém, ainda que dolorido, o caminho da aventura sempre traz bons frutos para quem trilha até o fim, sempre.

Do passo a passo da Odisséia, várias lições. Os heróis vencem sempre. Os heróis se cansam, mas não desistem. Os heróis usam de força e inteligência nas devidas proporções. Os heróis têm orgulho de si mesmos. Os heróis confiam em suas armas. Os heróis comentem erros banais quando deixam que a vaidade tome conta deles. Os heróis vão ao fundo da dor e ao pico da alegria e satisfação, e aproveitam ambas as situações. Os heróis ouvem os mais sábios. Os heróis lutam contra o destino, e às vezes conseguem mudá-lo. Os heróis são dispostos. Os heróis reconhecem que o caminho é mais importante que a chegada. E, acima de tudo, os heróis são apaixonados por um ideal que guia a sua própria vida, porque é da força da paixão que vem a força para chegar ao final e encontrar a paz.
A vida apresenta-se diante de todos nós como um caminho de volta para Ítaca. Nebuloso, incerto, turbulento, longo. Cheia de mares revoltos, períodos de calmaria, aventura e um desejo, lá no fim, de estar bem, estar em casa, seguro e tranquilo, com a missão cumprida. Algumas pessoas passam por esse caminho e são tragadas por ele, se deixam vencer pelo desânimo, pela mediocridade, pela corrupção de seus sonhos e ideais. Outras, até tentam, mas acabam por desistir. Mas há alguns heróis. Gente que passa pelo mesmo caminho e faz a escolha de lutar, incansavelmente, até chegar lá.
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Há quem acredite que os heróis são aqueles de espírito forte e luminoso, que escolhem ser assim, que escolhem lapidar-se para enfrentar a dor. E, o mais lindo de tudo, enfrentam. E mesmo quando perdem, acabam ganhando. Os heróis são pessoas especiais, que ainda não sejam famosos como Ulisses e Aquiles, são vencedores não porque ganham, mas porque escolheram encarar a diversidade ao invés de evitá-la.
[...]

Claro, Ulisses teve sorte. Mas não é só isso. Ser o herói da própria história é uma escolha e um mérito de cada um. E que bom que é assim.


Prof. Dr. Antonio Walter R. de Barros Junior
Professor de Literatura Latina e Universal

4 comentários:

Marcella disse...

Nossa,incrível!Amei!Me emocionei!

gizele disse...

Esta história conta um pouco da vida de pessoas como nós, que brigam, lutam e não desistem nunca.

bjos.
Gi.

Alice disse...

Nossa,somos heróis todos os dias e nem nos damos conta disso. Ótimo texto. Parabéns

Fernanda disse...

mto lindo, amei