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18 de janeiro de 2010

Camões, poeta da globalização


No último canto de “Os Lusíadas”, o décimo, o grande épico da língua portuguesa escrito por Camões, Vasco da Gama, o almirante herói, é recebido pela deusa Tétis na Ilha dos Amores. Lá, naquele espaço encantado, ela lhe descortinou a Máquina do Mundo, a visão do Cosmo e dos continentes da terra recém-descoberta pelos feitos dos lusos, cena que coloca o poeta português como quem por primeiro, no campo das letras européias, percebeu os efeitos irreversíveis da globalização que então dava os seus primeiros passos.

A festa na ilha dos amores

"...abrindo aqueles mares / Que geração alguma não abriu / As novas ilhas vendo e os novos mares..."      Camões, Os Lusíadas, Canto V, 4, 1572


Vinham os lusos em viagem de volta à boa terra, singrando pelo Oceano Índico, tendo no leme Vasco da Gama , quando as quilhas dos seus barcos deram de frente com a Ilha dos Amores. O tal acidente era uma fantasia criada por Camões no “Os Lusíadas”, espécie de paradoiro encantado encravado no azul dos trópicos. Nas praias, esperando-os estava ninguém mais do que Tétis, a deusa do mar, pronta a servir-lhes como amável hospedeira .

Um magnífico banquete logo lhes foi preparado. Cada nauta tinha ao seu lado uma bela ninfa, enquanto pela mesa espalhavam-se travessas e pratos de puro ouro ofertando-lhes as mais exóticas especiarias, vindas de cantos diversos daquele oceano. Nas taças, vinhos espumantes que deixavam longe, em paladar e aroma, os da Itália, tão apreciados naquela época em Portugal de D. Manoel o venturoso. Finda a festança, fartos de ambrosia e sexo, Tétis, assumindo-se como vidente, pôs-se a cantar os feitos magníficos que ainda aguardavam os portugueses nos anos vindouros: as façanhas de Duarte Pacheco , do próprio filho do Gama, resultantes do grande feito que se iniciara com a viagem do almirante luso.

O Gama é apresentado à máquina do mundo


Em seguida, cessada a flauta, sumido o verso, calada a voz , a deusa Tétis, deixando os demais convivas, levou Vasco da Gama pela mão para o interior da ilha, escalando com ele um monte bem elevado. Do alto dele, num chão apinhado de fulgurantes pedras preciosas, esmeraldas e rubis, Tétis, erguendo os olhos para o alto, indicou-lhe um fantástico globo. A deusa disse a ele que só estava ali para apresentar-lhe ao maravilhoso engenho em “ deleitosos versos”, porque o mundo pagão que ela representava já tinha saído de cena perante a força do Cristianismo. A gente do Olimpo agora só servia como cicerone ou emprestando-se, graças às famas passadas, à fantasia inspiradora de poetas como Camões. Não mais se intrometiam na vida dos mortais como, em épocas remotas, Atena fizera com Ulisses.

Bem acima deles, dela e do Gama, uma imensa esfera pairava no ar, flutuando no éter como diziam os antigos, como se estivesse presa no nada. A visão daquilo tudo era fantástica. Era a obra divina na sua totalidade que aparecia como se fosse uma maqueta do projeto do Criador. Nela, bem à vista do Gama, de maneira que hoje chamaríamos de imagem virtual, o Cosmo e a Terra, em colossal abraço geométrico se entrelaçavam formando a Máquina do Universo.

A geografia da conquista


"Em pequeno volume" disse-lhe a deusa "aqui te dou do mundo aos olhos teus, para que vejas por onde vás e irás e o que desejas". (Canto X,79). Em cima de tudo, dominando o firmamento, via-se o céu de Saturno, sob as ordens de quem giram, em orbes diferentes, os planetas e as constelações, enquanto que embaixo de tudo, no centro do sistema, via-se a pousada dos homens: a Terra (o cosmo de Camões ainda era o mesmo de Ptolomeu, não o de Copérnico). Local de sofrimento, de dano, de insanos, onde vários reis dividiam as nações entre si, no qual se destaca a Europa cristã, "mais alta e clara", a que avança sobre as demais em virtude da lei e da força:

"Vês aqui a grande máquina do Mundo,
Etérea elemental, que fabricada
Assim foi do Saber, alto e profundo,
Quem é sem princípio e mete limitada.
Quem cerca em derredor este rotundo
Globo e superfície tão limada,
É Deus: mas o que é Deus, ninguém o entende,
Que a tanto o engenho humano não se estende"
(Canto X, 80)

É então que a deusa, abrindo os braços para enfatizar a amplidão de tudo aquilo, a magnitude do reino augusto, aponta ao Gama as mais diversas regiões do mundo. Povoam-na “gente sem lei”, a bruta multidão, “bando espesso e negro de estorninhos”, do império do Benomotapa (o Zimbabwe de hoje) ao Taprobana (o atual Sri-Lanka). Todos eles estão a espera da chegada da cruz, desenhada na vela principal da nau dos argonautas lusitanos. Mostra-lhe então o Mar Vermelho, o Monte Sinai, a secura dura e arenosa da Arábia, o Rio Tigre o Eufrates, o planalto dos cavaleiros da Pérsia, o estreito de Ormuz, o Sind, a terra dos Brâmanes onde São Tomé tentara a conversão dos gentios, o Rio Ganges e o Indo, a terra da Birmânia, o império do Sião, a Ilha de Sumatra, a ponta estreita de Singapura, o Camboja e o rio Mecong (no qual Camões naufragou mas salvou os versos). Em seguida, margeando com os olhos a costa da Cochinchina (o Vietnã de hoje), mostrou-lhe a China e mais longe ainda o Japão, regiões de onde vinha a maravilhosa seda e o ouro fino. De tudo aquilo desprendiam-se o aroma do cravo, da noz moscada, do licor perfumado do benjoim, do coco do mar, do incenso da mirra e do precioso âmbar, de onde se extraem fragrâncias mil.

Texto estraído do site Educar Terra

Natassia

1 comentários:

Anônimo disse...

Como que alguém pode gostar de "Os Lusíadas" . O livrinho chato, ninguém entende nada. afffff. Tenho trauma dele no meu vestibular: a gente se mata tentando entender e depois nunca mais toca no assunto, ainda mais se fizer um curso em outra área. affff.